A primeira década dos “Vadios”

Cerveja Artesanal

Fotografia: Ricardo Garrido
Luís Alves

Luís Alves

Uma história como tantas outras, na sua origem, mas com alguns traços que a distinguem e a tornam única. Comecemos pela parte comum: um grupo de amigos junta-se ao fim de semana para produzir cerveja artesanal em modo recreativo. O que já não é tão comum é um desses amigos ter uma sólida formação no domínio cervejeiro, facto que deu forte impulso ao projeto Vadia, uma cerveja artesanal já bem conhecida dos portugueses, a celebrar a primeira década de vida.

 

 

 

Tem sede em Ossela, uma muito pequena freguesia do concelho de Oliveira de Azeméis, com pouco mais de dois mil habitantes. A Vadia nasceu há cerca de uma década e tornou-se por conta dos três fundadores – Nicolas Billard, Nuno Marques e Victor Silva – uma das cervejas mais reconhecidas no país. Quem nos recebe é precisamente Nicolas, que começa por recordar o ano em que veio a Portugal pela primeira vez. Estávamos em 1998. “Foi um pouco ao acaso. Naquela altura o serviço militar ainda era obrigatório e eu fiz uma candidatura a um programa de cooperação que mais não era do que poder cumprir essa obrigação através de um estágio numa empresa francesa a operar no estrangeiro. Encontrei uma empresa com uma filial em Vale de Cambra e estive em Portugal 16 meses”, conta Billard. E assim poderia ter terminado a história do francês em terras lusas, findo esse dever. “Nesse período em que estive em Portugal conheci a minha mulher, casei e fiquei por cá até hoje”, conta o francês, nascido no sul da Borgonha, numa família ligada ao setor agrícola.


Instalado em Portugal, os fins de semana eram passados entre amigos e os sábados, especificamente, a tentar as primeiras experiências de um produto que, em 2006, era quase uma incógnita. Nicolas, Nuno e Victor começaram a fazer cerveja em 2006, em casa dos sogros do francês, rodeados de amigos. O que começou por ser uma brincadeira passou a ser um hábito e mais tarde, em 2008, participaram pela primeira vez nas festas do município de Vale de Cambra onde a necessidade de produção aumentou consideravelmente.

O percurso do combatente e o portefólio

O negócio estava à espreita, como em tantos outros exemplos que começam apenas por ser uma brincadeira entre amigos. Mas aí residia provavelmente o primeiro grande desafio. “Foi o início do percurso do combatente”, resume Nicolas. “Em 2010 criamos a nossa empresa para começarmos a comercializar a nossa cerveja, até por todas as questões legais. Mas só em 2012 é que conseguimos começar a comercializar. O que deveria ter demorado dois meses, demorou dois anos”, recorda o fundador da Vadia. Ultrapassadas as questões legais, foi tempo de avançar para a produção que já havia começado antes, ainda em modo “beta”. O objetivo estava traçado desde as primeiras produções: “Não queríamos fazer a melhor cerveja do mundo. Queríamos, isso sim, fazer cervejas que fossem o ponto de encontro das pessoas para fazer o que nós fazíamos que era conviver. E começamos por cervejas que as pessoas já conheciam, mesmo em Portugal onde não havia uma grande cultura cervejeira artesanal”, conta Billard. E então nasceram as cervejas do portefólio fixo, a chamada gama original, onde constam as cervejas “loira, trigo, preta e rubi”, por exemplo.


Da gama original partiram para o próximo nível. As cervejas de harmonização, normalmente de estilos mais complexos, começaram a tornar mais robusto o portefólio da Vadia. “Fizemos, por exemplo, uma interpretação do estilo Doppelbock, uma cerveja muito maltada, histórica e capaz de harmonizar bem com muitos pratos”, assegura Nicolas. Seguiu-se uma IPA (Indian Pale Ale), capaz de estar ao nível de comidas mais picantes, por exemplo, e também uma Baltic Porter, um estilo reinterpretado pela Cerveja Vadia, com notas evidentes de café, chocolate e tosta.


Ainda no portefólio mas já fora das cervejas, importa destacar um domínio onde a Vadia tem sabido também investir: as sidras. “Surgiram em 2017 e trata-se de uma forma muito clara e evidente de provar como funciona a economia circular porque utilizamos um subproduto da maçã”, explica o fundador. Através de uma parceria com a Universidade de Aveiro e um estagiário que colaborou com a cervejeira, conseguiram reaproveitar o retentado, um concentrado de maçã que apesar de ter valor energético não tem valor comercial. No final, ficou uma sidra pouco vínica mas muito concentrada em sabor.

Os “Vadios”

Recuemos ao início da história. Da produção caseira entre amigos, aos fins de semana que causava persistentes e muito comentados atrasos nos compromissos dos então jovens Nicolas, Victor e Nuno. É não só aí que nasce uma cervejeira nacional como também o nome que hoje todos conhecem. “A nossa produção era de facto artesanal e manual. Surgiam vários problemas e tínhamos de os resolver. O que nos custava em atrasos sucessivos aos jantares de sábado à noite entre amigos.

Normalmente chegávamos por alturas da sobremesa. E isso teve consequências. Começamos a ser os ‘Vadios’”, lembra, Nicolas, entre risos. Daí até ao nome final da cerveja foi um pequeno passo. E entretanto já passou uma década de existência que, por azar, coincidiu precisamente no ano de 2020. “Tudo o que tínhamos previsto foi cancelado. Isto é, as muitas celebrações e concertos que tínhamos imaginado para o ano passado não aconteceram. Mas houve algo de que não abdicamos: a nossa cerveja comemorativa e colaborativa, com 10 tipos de lúpulo diferentes que em comum têm o facto de terem sido integralmente produzidos em Portugal”, conta Nicolas. Uma “receita” que vai ter novidades nos próximos tempos, com o apoio dos produtores locais de lúpulo.


Cerveja Vadia
Rua Comendador Artur J. G. Barbosa, 576
3720-005 Ossela
Oliveira de Azeméis
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