Estrelas de Portugal: Rui Abecassis

Fotografia: Fotos D.R.
Luís Alves

Luís Alves

Em tempos de pandemia mundial, uma entrevista via skype numa rubrica internacional é o equivalente a um tiro no escuro. Se em períodos de salubridade global, a localização do entrevistado era um ponto certo, de conhecimento prévio, o nome de código “COVID-19” veio trazer novas surpresas. Com Rui Abecassis, por exemplo, fundador da muito conhecida Obrigado, importadora de vinhos portugueses para o mercado norte-americano, pensávamos estar a fazer uma chamada para o outro lado do Atlântico. Afinal, não. Rui viu a ponte aérea, em que vive boa parte do seu ano, quebrada, facto que o fez basear-se em Lisboa por estes dias de confinamento. “Imagino que seja possível ir de cargueiro até aos Estados Unidos. Alguém sabe se é possível?”, pergunta Rui, num tom irónico.


A Obrigado – hoje Olé & Obrigado, fruto da parceria com uma empresa americana dedicada a importar vinhos espanhóis – nasceu em 2010. “É assustador pensar que já passou uma década desde a criação da Obrigado”, recorda Abecassis. “Na altura, percebemos que havia uma oportunidade naquele mercado, sobretudo para o Vinho Verde. Começamos então com uma referência que ainda hoje existe, do Luís Duarte, que acreditou em nós e nos deu crédito: o Vera Vinho Verde. Por incrível que pareça continua a ser uma grande referência no nosso portefólio”, refere o importador. Atualmente, e depois do Vera, a Obrigado consolidou-se no mercado com um portefólio médio-pequeno, em número. Têm cerca de 60 referências de uma dúzia de produtores. “Um portefólio contido”, remata Rui Abecasssis que se vê, de vez em quando, a recusar vinhos de que gosta, de pessoas de quem gosta para não correr o risco que muitas vezes vê noutros importadores, de alimentar em demasia o portefólio e depois de não conseguir dar uma resposta efetiva e de manter uma relevância junto dos pares e dos clientes. A par desta razão, há uma outra. Desde 2013 que a Obrigado tem um portefólio paralelo com a Olé Imports, uma empresa americana que importa vinhos espanhóis. Há cerca de um ano e meio, fizeram um rebranding e agora a empresa chama-se Olé & Obrigado. Por isso, o portefólio já não são apenas as 60 referências portuguesas, são também as 140 referências espanholas.

EUA: um mercado plástico

Mais de uma década a trabalhar o mercado americano, Rui Abecassis tornou-se um bom e muito competente intérprete em terras do Tio Sam, onde vários produtores portugueses estão ou querem estar presentes. “É um país enorme, são 50 estados que se traduzem em 50 mercados, com uma abertura ao mundo extraordinária. São experimentais, estudiosos e analíticos. E muito curiosos. Só isso justifica a presença dos vinhos portugueses lá. Um exemplo recente: Colares. De repente, na comunidade de sommeliers e apreciadores de vinho, todos questionam Colares. Querem saber mais”, conta Abecassis. E o mesmo tem acontecido, por exemplo, com a sub-região de Monção e Melgaço, os vinhos de António Maçanita no Pico, o que tem feito o produtor Luís Seabra ou os vinhos antigos das Caves S. João, para dar alguns bons exemplos. Mas esta é uma realidade com poucos anos. Quando a Obrigado nasceu, em 2010, os americanos tinham muitas dúvidas. A certa altura, não sabiam se Portugal era novo ou velho mundo. Mas houve um esforço muito grande”, recorda Abecassis. Instituições, públicas e privadas, os média, os produtores e até a TAP que reforçou largamente a oferta de voos para os EUA. Todos esses esforços coincidiram temporalmente e tornaram a Obrigado uma empresa “que nasceu no tempo certo”. “Outras houve que tentaram antes, e tentaram de forma competente. Mas, como dizem os americanos, “being early is the same as being wrong” [em tradução livre, “chegar cedo é o mesmo que não chegar”]”, comenta Rui Abecassis.

De uma pequena loja no Estoril

Com 10 ou 11 anos, Rui Abecassis não imaginava trabalhar em vinhos. Apesar disso, ali e acolá, estavam alguns sinais. O primeiro talvez tenha sido ali junto ao Casino Estoril onde o pai abriu uma loja de vinhos, numa galeria. “Era um hobby de fim de semana. E por isso rapidamente fechou. Os vinhos precisam de mais dedicação, mais tempo. E não é um mercado fácil. Mas tenho-o como o meu primeiro contacto com vinho”, recorda Abecassis. O segundo sinal terá vindo da muito respeitável garrafeira de temperatura controlada que o pai tinha em casa, com cerca de 600 garrafas. Depois, afastou-se das lides vínicas por uns largos anos. Foi funcionário público na AICEP e começou a trabalhar no Santiago do Chile, em 1998. Seguiu-se uma experiência na Argentina, onde viveu quase seis anos, na delegação que a AICEP ali abriu. Mais tarde, foi transferido para Nova Iorque, em 2005, e em 2008 termina a carreira como funcionário público para se juntar à José Maria da Fonseca, como representante da marca nos Estados Unidos. Dois anos depois cria a Obrigado que hoje mantém a força de representação de referências nacionais apesar do parêntesis que tem sido o COVID-19.