Quinta do Piloto: Identidade e convicção

Fotografia: Ricardo Garrido

Ao passar pelo Douro, bem junto ao rio, Filipe Cardoso olha sempre com admiração para a paisagem vinhateira, onde a insígnia de cada casa produtora está bem visível, quase sempre pintada em muros ou paredes exteriores de adegas. Capta a mensagem como um ato de orgulho na marca da parte de quem faz vinho, pelo que decidiu fazer o mesmo na Quinta do Piloto.


Estamos em Palmela, região de vinhos da Península de Setúbal. A história da Quinta do Piloto inicia-se em inícios do século XX, tendo por protagonista Humberto Cardoso. Criou das primeiras rodoviárias do país, a Autocars Palmelense, que ganhou importância e dimensão a ponto de ter sido pioneira na ligação internacional Cacilhas – Sevilha. Vendeu entretanto o negócio a outro operador e reinvestiu tudo na compra de herdades (Fonte da Barreira, Lau e Aldoal), tendo totalizado 500 hectares de vinhas. Ergueu também duas adegas, uma na Quinta do Piloto e outra na Adega da Serra, do lado oposto da estrada nacional 379.

Ao longo de décadas, o vinho elaborado foi vendido a granel, até que Filipe Cardoso decidiu, em 2013, apresentar a Quinta do Piloto ao mercado como produtor engarrafador. 

O primeiro vinho nasceu de um aparente erro, mas o sucesso foi de tal ordem que é hoje o “blockbuster” do Piloto. A ideia era obter um rosé tranquilo a partir do Moscatel Roxo, mas durante a vinificação a cor mostrou-se branca, pelo que optou por não insistir a conferir pigmentação rosada e assumiu-o como um vinho branco. É de fácil apelo e surpreendente boa evolução, conforme pudemos verificar em prova vertical.

Na atualidade, a Quinta do Piloto detém 212 hectares de vinhedos, incluindo 3,5 hectares de Moscatel Roxo e uma outra preciosidade, 35 hectares de vinhas velhas de Castelão em solos arenosos.

A vinificação do Castelão continua a ser realizada em tradicionais cubas argelinas, estas com a particularidade de serem redondas. Filipe Cardoso, o produtor e enólogo, acredita tratarem-se da solução mais indicada para potenciar as melhores características da casta, argumentando que ajudam na concentração em anos mais difíceis. A par disso salientar que é um sistema sustentável de fermentação, uma vez que reutilizam a energia libertada pela fermentação para concretizar as remontagens, não havendo necessidade de recorrer a bombagens na adega.

No capítulo dos moscatéis fortificados, a Quinta do Piloto assume um estilo de concentração e alguma rusticidade. Os mais antigos datam de finais da primeira década de 1900, estão preservados em pequenas barricas de 100 litros e essas “mães” centenárias enriquecem e aceleram o envelhecimento dos mais jovens, que estagiam em barricas velhas de conhaque e whisky.

“O meu sonho é continuar a fazer grandes vinhos”, assume Filipe.

São 80.000 garrafas de produção média anual, 35% das quais vendidas em mercados como Suíça, Dinamarca, Brasil, Angola, Reino Unido, Estados Unidos e Ásia.

O enoturismo tem acompanhado a afirmação do projeto, com programas que incluem provas, piqueniques, a possibilidade de refeições e alojamento na quinta e as já famosas adiafas da Quinta do Piloto.

TEXTO: José João Santos e Nuno Gudes Vaz Pires