Uma Nortada de ar fresco

Fotografia: Ricardo Garrido
Luís Alves

Luís Alves

“Foi um projeto sacado a ferros”, começa por dizer Pedro Mota, CEO da Nortada. Não é para menos, sobretudo quando se olha à dimensão da cervejeira, do projeto e do investimento ali concretizado, no centro do Porto, na Rua de Sá da Bandeira. “A ideia surgiu em 2013, minha e de um sócio que agora já não está connosco. Trabalhávamos em empresas não ligadas ao setor mas que tinham negócios com cervejeiras. E vimos ali uma oportunidade”, recorda o empresário que imaginou uma cervejeira artesanal profissionalizada e com uma visão de mercado bem definida.


O próximo passo foi o desenho do plano de negócio e um posterior “roadshow” para angariar capital. “Foi um processo que demorou quase dois anos. Fizemos dezenas e dezenas de apresentações do projeto a pessoas muito diferentes. Da indústria à restauração, passando por áreas totalmente alheias. Portugueses e estrangeiros. E no final do verão de 2015 tínhamos já 75% do capital desejado – cerca de três milhões de euros – que ficaram totalizados no final desse ano. Depois foi tempo de finalizar o plano de negócios, levantar o capital, criar uma sociedade anónima com a entrada dos sócios e arrancar finalmente com o projeto, passando do papel para um prédio inteiro no Porto”.


Bairrista mas não tanto


A regionalidade da Nortada termina quando o objetivo de ter uma boa base local está cumprido. “Sabemos que muitas marcas de cerveja artesanal, para se estabelecerem, têm uma base sólida associada a uma cidade ou a um local. A Nortada é do Porto e é identificada como tal mas somos também do resto do país”, explica Pedro Mota. “O Porto tem um bairrismo reconhecido e isso ajuda-nos a criar a marca. Mas repare: somos Nortada. E nortada temos de Valença até Sagres, o tão tradicional vento fresco que se faz sentir na praia”, sublinha.

A Nortada veio então agitar águas com cinco cervejas iniciais, especialmente feitas para serem “entradas de estilo”, isto é, são cervejas artesanais, sim, mas acessíveis. Pedro Mota dá o exemplo da IPA da marca, feita para principiantes. “É a nossa segunda cerveja mais vendida, depois da Lager, e trata-se de uma IPA bebível. Ou seja, uma cerveja para quem vem das industriais não sentir um choque brutal. Com um projeto desta dimensão, temos obrigatoriamente de ter volume. São três milhões de euros investidos inicialmente, a que se juntaram já seguramente mais dois milhões de euros em melhorias. Não podemos fazer cervejas de nicho”, remata. Com o portefólio base bem assente, em velocidade cruzeiro, as cervejas para públicos restritos podem até surgir e isso já vem acontecendo. “Este ano, por exemplo, estamos a lançar uma cerveja em cada mês. Pequenos lotes experimentais. Se forem bem recebidas, avançamos para produções maiores”, conta o cervejeiro que tem como exemplo mais bem-sucedido a “Obrigado”. Uma cerveja feita em parceria com a Dott, de agradecimento aos profissionais de saúde que estiveram na linha da frente da pandemia e cujos lucros revertem totalmente para a Cruz Vermelha Portuguesa.


A cerveja como o vinho


Pedro Mota vê muitas semelhanças no caminho da cerveja artesanal dos últimos anos e o do vinho nos anos 90 e início dos anos 2000. “Em Portugal, um país de vinho, tínhamos algumas marcas de topo. Com a evolução tecnológica e de conhecimento, passamos a ter centenas de marcas de topo, com vinhos extraordinários. A cerveja está a fazer esse caminho. A concorrência aumentou, o número de marcas também, com mais técnica e conquista de mercados”, refere.

No próximo ano, espera-se da Nortada um caminho um tanto diferente dos últimos anos. O portefólio fixo e de massas mantêm-se mas a experimentação vai ter um lugar mais visível. “Queremos fazer crescer alguns projetos considerados hoje de nicho. Se funcionarem bem, passam para a nossa linha ‘mainstream’, explica Pedro Mota que vê a necessidade de formar públicos. A pensar também nisso, e a vários níveis de educação, a Nortada estabeleceu uma parceria com a Escola Superior de Cerveja e Malte, de Santa Catarina, no Brasil. “Temos um colaborador nosso que foi professor lá e percebemos que havia o desejo desta reconhecida escola entrar na Europa. Viram em nós, pela dimensão, um bom parceiro e vamos ter cursos de vários tipos e para públicos diversos, dos mais amadores até aos mestres cervejeiros, com aulas práticas na fábrica da Nortada”, anuncia Pedro Mota.