Vinho Verde encara retoma com expetativas otimistas

Fotografia: Arquivo
Marc Barros

Marc Barros

A região dos Vinhos Verdes deverá registar quebras de vendas entre 14 e 15% no período da pandemia face ao período homólogo de 2019; estes números sucedem-se a dois meses de janeiro e fevereiro considerados excecionais e que faziam antever mais um ano de recordes nas vendas da região. Porém, Manuel Pinheiro, presidente da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes, estima que, apesar de estes valores poderem ser considerados razoáveis face ao cenário vivido, nem todos os operadores o sentiram da mesma forma. “Foi mais difícil para os pequenos produtores que dependem da restauração e menos difícil para quem trabalha a exportação e a grande distribuição”.

 


Mercados como Suécia e Noruega tiveram resultados muito positivos nas vendas de Vinho Verde, enquanto Brasil e EUA mostraram desempenho oposto. Porém, Manuel Pinheiro nota dois fatores que favorecerão os Vinhos Verdes nesta fase de retoma: “A última colheita de 2019, que está a entrar agora no mercado, foi de excecional qualidade”. Por outro lado, “a CVRVV reestruturou o seu plano estratégico de investimentos”, no montante de 300 mil euros, lançando um conjunto de iniciativas, entre as quais uma campanha promocional, já tornada pública, orçada em 100 mil euros, com a restante dotação a ser colocada ao longo dos próximos meses, podendo ser reforçada.
No decurso de um périplo de balanço pela sub-região de Amarante, foi possível tomar conhecimento do impacto que a pandemia teve em quatro produtores: Casa da Calçada, Casa de Cello, Casa de Vila Nova e Quinta da Lixa. 

Casa da Calçada

“O ano começou muito bem, com bons resultados em mercados novos e muito bons nos mercados já existentes”, afirmou André Estácio Pinto, responsável da Agrimota. Com cerca de 90% da produção destinada aos mercados externos, foi possível contornar as dificuldades colocadas pela pandemia. Isto porque verificaram-se diferenças nos comportamentos dos diversos países em função da evolução geográfica da própria doença ao longo das semanas. “Os EUA – mercado onde a empresa marca presença em 34 dos seus estados - foram o último país a reagir e deverão ser o primeiro a retomar. No final de março o pipeline de encomendas estava cheio e verificou-se algum afundamento na primeira quinzena de abril; em maio voltou novamente à carga”, sublinhou. Já o Brasil teve um comportamento muito negativo, fruto igualmente das enormes variações cambiais, enquanto o Reino Unido, onde o Vinho Verde “está a ser redescoberto”, teve um desempenho surpreendente. 
Na Europa, o mercado “ainda está muito parado mas com a abertura do canal Horeca serão retomadas as vendas”, antecipa. 
Entre as estratégias comerciais adotadas contam-se a “retoma de contactos comerciais das feiras e eventos profissionais cancelados”, a aposta no canal online junto de alguns mercados, como Alemanha, e novas parcerias comerciais, concluiu.

Casa de Vila Nova

Este produtor, que explora cerca de 30 ha, manteve “as exportações a níveis de 2019 no período homólogo”, assegura Bernardo Lencastre. O canal off trade apresentou uma ligeira paragem, fruto da “distribuição dos produtos”. Já o mercado Horeca apresentou uma paragem total. 
O enólogo António Sousa, parceiro na AB Valley, explicou que as exportações conseguiram compensar as perdas internas, com mercados como Reino Unido, Suécia e Noruega, que gastavam 6 a 7 mil garrafas, a triplicarem as compras. Porém, esse aumento não foi sentido no fluxo de pagamentos, quer de clientes, que estenderam prazos de pagamento, quer de fornecedores, que o encurtaram. Mas outras boas notícias surgiram, como a colocação de um tender de 100 mil garrafas junto da companhia de aviação EVA, de Taiwan.

Casa de Cello

Para este produtor de vinhos de terroir de elevada qualidade e preço médio alto, a pandemia mostrou-se nefasta, uma vez que, segundo João Pedro Araújo, “as nossas vendas são feitas ‘à mão’, como costumo dizer”. Ou seja, tratando-se de um viticultor independente que opera numa lógica de vinhos de nicho, que trabalha apenas com as próprias uvas, não marca presença na grande distribuição. Classifica as últimas semanas como “horríveis”, com quebras de 98%. “Trabalhamos numa rede de distribuição mundial, nas garrafeiras e restaurantes, que está completamente fechada”, sublinha. Porém, não cairão “no erro de baixar preços”, assume. Até porque, segundo João Pedro Araújo, “nos primeiros dois meses e meio de 2020 estávamos a crescer 100%”.
Este operador lança o apelo ao Ministério da Agricultura para um maior apoio ao setor, sobretudo os viticultores independentes: “Não podemos mandar as pessoas para lay-off, pois a vinha precisa de ser tratada todos os dias, sobretudo num ano, como este, com grande pressão de doenças e é preciso fazer muitos tratamentos”. Até por isso, os custos aumentam, nota. E, para produtores como o próprio, que apostam no lançamento de vinhos com estágio, por vezes de vários anos, pedem apoios ao armazenamento. 
No entanto, mostra-se confiante quanto aos próximos meses com a abertura da restauração, apesar de uma certa preocupação com o Algarve: “Não porque os restaurantes não queiram abrir portas, mas porque não há pessoas, nem aviões”.

Quinta da Lixa

Na Quinta da Lixa, um dos maiores operadores da região, “não houve perdas de vendas, pois conseguimos canalizar para mercados que compensaram os timings de evolução da pandemia”, resumiu Carlos Teixeira, enólogo e diretor comercial da empresa. Por outro lado, o “off trade foi muito importante”, sendo que o online “deu uma grande ajuda em muitos mercados”.
Nesta linha, e englobando aqui toda a região, Óscar Meireles, diretor geral da Quinta da Lixa, assumiu que “70% a 80% da região está muito bem preparada pois exporta grande parte da sua produção”. E confia numa rápida retoma, fruto da capacidade de adaptação dos seus operadores.