Rosa da Mata: Nome de Alfrocheiro

 

Viva, exuberante, alegre, elegante, por vezes um pouco rude, mas sempre genuína. Descritores que assentam à casta Alfrocheiro? Sim, mas também a Patrícia Santos, a enóloga que transformou os vinhos desta variedade, que trabalha como poucos, numa homenagem à avó, Rosa de Jesus, também conhecida como Rosa da Mata. 


Patrícia é, como se costuma dizer, uma força da natureza, alguém que cativa pela sua personalidade franca, sincera e genuína. Natural de Canas de Senhorim, Patrícia Santos é também uma enóloga de mão cheia, que vem desenvolvendo um percurso sólido, ora acompanhando “o mestre” Anselmo Mendes nos seus projetos do Dão e Beira Interior, mas também com a ousadia para lançar os seus próprios vinhos, desafiantes e originais, como o projeto Rosa da Mata, assente na variedade Alfrocheiro.

As uvas utilizadas são provenientes da Quinta de Silvares, na sub-região de Besteiros. Trata-se de uma vinha de 7 ha. que está sob gestão do enólogo Anselmo Mendes e tem plantadas apenas castas tintas: Touriga Nacional, Jaen e Tinta Roriz, para além da Alfrocheiro. “A primeira vindima foi a de 2015 e vinificamos por castas, pelo que fomos apercebendo todo o potencial das castas”, recorda Patrícia. “Apaixonei-me pelo Alfrocheiro e no ano seguinte decidi fazer um vinho monocasta com uma abordagem um pouco diferente”. No final da vindima “propus ao mestre se poderia fazer um projeto em nome próprio, em pequena quantidade, apenas 1.000 litros de vinho de um vinho de autor”. 

Com a sua anuência, Patrícia decide elaborar um vinho capaz de mostrar todo o potencial da casta. “A minha intervenção é muito reduzida, o vinho é fermentado em inox, sem controlo de temperatura, com pisa a pé, prensado e fica em estágio na cuba, sendo engarrafado entre julho e agosto do ano seguinte à colheita”. Permanece “quatro meses em garrafa e começa a ser comercializado; ou seja, tudo aquilo que não se deve fazer!”, brinca. No entanto, “como é tão puro na sua simplicidade, consegue ser bebido de imediato ou pode ser guardado por alguns anos”. Como enóloga, Patrícia Santos afirma apreciar “vinhos jovens, que tenham o sabor da casta, fruta mas também a mata, o musgo”. Daí que “este vinho não passe por madeira, para exaltar o potencial da casta e dos seus aromas primários”.

O nome do vinho surgiu precisamente quando Patrícia e Anselmo estavam a prová-lo: “Cheirou-se muito a mato, a musgo, e a minha avó paterna, que se chamava Rosa de Jesus e vivia em Canas de Senhorim, era conhecida como Rosa da Mata. Passei com ela a minha infância e o vinho recordou-me dela, pelo que decidi dar-lhe o nome da minha avó”. O vinho tem ainda outra simbologia cara a Patrícia, relacionada com a rosa da obra ‘O Principezinho’, de Saint-Exupéry. Este vinho retrata, afinal, o Dão de Patrícia Santos: “Vinha entre socalcos e penhascos, pinhais e cheiro a mato”.


Potencial máximo

A variedade Alfrocheiro é difícil na vinha, “suscetível à geada e, na Quinta de Silvares, está implantada numa zona onde passa um ribeiro”. Sendo uma zona muito húmida, dado o efeito da barragem da Agueira, a casta “é também suscetível ao míldio e, depois, à podridão”. Talvez “tenha sido por isso”, sugere Patrícia, “que no Dão se optou por outras castas em detrimento da Alfrocheiro”. Por não ser “muito produtiva, dispensa mondas”. E se “nem sempre conseguimos ter quantidade”, “não há ano em que não atinja o seu potencial máximo”.

Na sub-região de Besteiros, “temos a barragem, a neblina, a frescura, sem excessos de maturação, as grandes amplitudes térmicas do dia para a noite, que são muito boas para a uva, que se apresenta perfeita e genuína”. Assim, “não precisa de cuidados em termos de pH e acidez, comparativamente a todas as outras, e é aquela que representa efetivamente o Dão”, conclui Patrícia Santos.

Por isso o vinho “é feito sempre da mesma vinha, do mesmo modo, para que possamos aperceber-nos da interferência do aporte climático nas características da casta”. Da mini-vertical realizada, foi possível aquilatar a diferença que o tempo em garrafa exerce sobre a variedade da casta Alfrocheiro quando vinificada como Patrícia o faz. “Notamos desde logo que o exemplar de 2017 se destaca como muito diferente, por ter sido um ano seco, difícil e quente, sem chuva até março. Apresenta menos acidez e mais álcool, é mais exuberante aromaticamente, com mais fruta e menos notas de mato e musgo”. E se 2017 é “perigosamente sedutor”, os anos 2016 e 2018 “são muito semelhantes em termos de aroma”. Patrícia salienta que o 2016, “com estes anos de garrafa, revela-se um grande vinho (de classificação etária elevada?), pois o tempo de garrafa está a fazer-lhe muito bem”. Por sua vez, “2018 está um vinho como eu quero, um vinho jovem, do ano, que mostra a rudez e a austeridade da casta, a rusticidade de boca, mas acaba por se limar numa elegância e taninos muito suaves”. É este o perfil do Rosa da Mata, vincado no antagonismo entre a elegância e a rusticidade, na qual Patrícia se revê – “até em termos de personalidade!”

Rosa da Mata
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Texto: Guilherme Corrêa e Marc Barros
Fotos: Daniel Luciano, Jorge Matos e Ricardo Garrido